Ricardo K: consultas de companhias com pedidos de reestruturação cresceu 300%

Ricardo K: consultas de companhias com pedidos de reestruturação cresceu 300%

Há dois anos que Ricardo Knoepfelmacher (mais conhecido como Ricardo K.), sócio da RK Partners, responsável pelas principais reestruturações de empresas no Brasil, já alertava sobre os riscos de dinheiro abundante no mercado. Isso porque deu a falsa ideia de que estava tudo bem. Na ocasião, o consultor chegou a confirmar que, na verdade, as empresas entrariam em recuperação judicial ou estavam para fazer um IPO, e que a conta chegaria em dois anos.

Real Situação por Ricardo Knoepfelmacher

Além disso, Ricardo Knoepfelmacher revelou em recente entrevista que o volume de consultas de companhias com pedidos de reestruturação de dívida cresceu 300%.

Para o CEO da RK Partners, hoje, o cenário é mais complicado, com juros altos e restrição de crédito por conta do caso da Americanas. Todavia, ele diz que a decisão dos bancos de segurar o crédito pode piorar ainda mais a situação.

“Os bancos estão pensando no balanço deles, mas pode haver um efeito sistêmico no varejo.”

Ricardo K

Entrevista de Ricardo K ao jornal O Estado de S. Paulo

Confira a seguir os trechos mais importantes da entrevista.

Ao ser questionado sobre o cenário estar mais complicado para as empresas em 2023, Ricardo K diz há uma conjunção de três fatores. São eles:

“A desorganização das cadeias produtivas no pós-covid aliada à guerra da Ucrânia, que elevou o preço da energia e provocou inflação mundial, além do caos político interno, que acabou fazendo com que o nosso juro básico ficasse altíssimo.

Estamos falando de uma taxa de 13,75% ao ano. Uma empresa grande está captando a CDI mais 3%. Uma empresa média, a CDI mais 6%. Isso significa uma taxa de 20% ao ano. É muito difícil uma empresa que esteja alavancada não ter problema.”

Empresa alavancada

Já em relação ao grau de alavancagem das empresas atualmente, ele diz que, “até por causa da crise, é mais ou menos a metade do que a gente via no governo da presidente Dilma (Rousseff)”.

No entanto, Ricardo Knoepfelmacher diz também que as companhias que estão alavancadas estão passando por grandes problemas, principalmente nos setores dos quais os bancos estão mais apavorados, como o varejo, por exemplo.

“Aí a situação de crédito e de renovação de linhas têm sido dramática. Esse movimento que a gente começa a ver com Americanas é o início de uma onda que virá por aí de empresas médias e grandes pedindo água.”

Ricardo K da RK Partners

Origem do problema

O CEO da RK Partners diz que sempre achou que o problema não aconteceria durante a pandemia de Covid-19. Isso porque quando a crise sanitária começou, “os bancos decidiram chamar os clientes para renegociar e rolar as dívidas”. E ainda acrescentou:

“Há três, quatro anos elas se beneficiaram de um excesso de liquidez e boas taxas de juros. No segundo semestre, está vencendo uma série de emissões de grandes empresas.”

Impacto da Americanas

Ricardo K disse também que ninguém imaginava esse problema numa das maiores empresas de varejo do Brasil. E isso faz com que os bancos fiquem muito mais cautelosos e tenham uma postura mais conservadora ainda na concessão de novos empréstimos e na reprovação dos atuais, o que inclui empresas que não estão associadas à Americanas.

Porém, empresas menores que necessitam desse tipo de capital de giro não estão conseguindo obter crédito. “Alguns bancos determinaram que esses produtos não são mais oferecidos. Isso vai provocar uma grande contração de crédito”.

Isso não é um tiro no pé?

“Sim e não. Isso pode criar um círculo vicioso. Numa empresa como Americanas, o ciclo médio de venda e recebimento era padrão. Ele recebia e pagava o produto entre 90 e 120 dias.

Ela comprava chocolate e pagava em quatro meses. Agora quem vai querer vender sem ser à vista? A situação que era ruim vai piorar muito. Os bancos, quando veem essa situação, diminuem o risco setorial. Se der problema em outras companhias, o nível de provisão dos bancos tem de aumentar.

Mas, ao não dar crédito, a chance das outras empresas solapar aumenta. Eles estão pensando no balanço deles, mas isso pode ter um efeito sistêmico, pode afetar muito o varejo. E, para ajudar, vamos ter uma recessão pela frente, com juro alto. Não estamos num bom momento da economia.”

Setores mais atingidos

Ricardo Knoepfelmacher explica que alguns setores não conseguiram se recuperar até o momento. É o caso da infraestrutura. As grandes empreiteiras estão combalidas, uma vez que não possuem investimentos. Neste caso, não possuem pipiline de obras, se sgeuirão combalidas.

Por outro lado, ele afirma que companhias que não tinham entrado em recuperação judicial devem entrar agora.

“Essa é a tendência. O setor de construção residencial também vai sofrer. Por mais que os preços tenham subido, eles não conseguiram repassar o aumento dos insumos, como o preço do vidro, do cimento, do ferro, os insumos da obra. Estamos vivendo um caso semelhante ao que vimos há alguns anos, em que houve um colapso setorial.”

Então o problema pode atingir vários setores?

“A taxa de juro alta vai trazer um problema que permeia vários setores. Vai haver uma contração da economia e o País não vai crescer como muitos imaginavam. Então acredito que vai ser um problema na economia como um todo. A taxa de juros vai ser um grande inibidor do crescimento e vai atrapalhar muito a vida das empresas que precisam renegociar as suas dívidas.”

Número de RJs

Para o CEO da RK Partners, geralmente, o número de processos no Brasil sempre gira em torno de 1.300 a 1.500 recuperações por ano. Mas, na pandemia, ficou em 1.400. Contudo, ele não acredita numa explosão, pois a recuperação é um processo caro para as empresas. Além disso, não é qualquer companhia que possui condições de fazer uma recuperação judicial, pois todos os trâmites são caros. Mas, o que mede a situação complicada é a inadimplência.

“Hoje 30% das empresas brasileiras estão inadimplentes. Basta olhar na Serasa para ver que empresa pequenas, médias e grandes estão com dificuldade de pagar em dia as suas dívidas. Hoje o mercado não tem liquidez para que as grandes empresas possam fazer novas emissões de títulos.”

Essas empresas vão virar empresas zumbis?

Neste quesito, Ricardo K diz que haverá um aumento da RJ, com certeza, mas que está circunscrito a elite dessas empresas maiores. Já as outras terão de entrar em negociações bilaterais com os bancos. Entretanto, tal atitude fará com que os bancos se contraiam ainda mais na concessão de crédito. O consultor comenta que 2023 já começou com grandes provisões, de alguns milhões, e isso não é comum para um início de ano. “Em geral esses ajustes são feitos sempre no último trimestre. Então eles vão apertar mais para que a coisa não piore ao longo do ano”.

Em 2020, o sr. havia dito que as empresas estavam entre pedir recuperação judicial e fazer um IPO? A conta chegou?

“Havia uma abundância de crédito e demanda por IPO. Qualquer plano de negócio que se colocava no mercado, vendia. A taxa de juros de renda fixa estava muito baixa e as pessoas queriam mais remuneração.

Então a empresa tinha as opções de entrar em recuperação judicial e reestruturar a dívida, captar via dívida para pagar o crédito velho ou captar através de equity num IPO. Então quem é que pagou o pato por essa por essa orgia de IPO desgovernados?

Foi o coitado do investidor. Dos 83 IPOs feitos em 2019 e 2020, 80% valem menos do que quando fizeram a oferta de ações. Isso porque o plano de negócios não deu certo. Todas as previsões de geração de dividendos e preço da ação se frustraram. Mas elas não fizeram novas dívidas. O investidor tem uma empresa que vale 10% que valia quando ele entrou no IPO, mas pelo menos ela não quebrou. Ainda.”

Foto de sylvie muller no Pexels: https://www.pexels.com/pt-br/foto/foto-de-baixo-angulo-de-edificios-com-janela-cortina-160389/

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