O mercado de trabalho em tecnologia nos Estados Unidos passa por um período de ajuste que preocupa economistas e profissionais da área. Após anos de forte expansão, o setor enfrenta demissões em larga escala, redução no número de vagas abertas e um ambiente marcado por incertezas econômicas e pela rápida adoção da inteligência artificial. A combinação desses fatores tem alterado a dinâmica de um segmento que, até recentemente, era visto como um dos mais promissores do país.
Ao longo do último ano, grandes empresas de tecnologia, como Amazon, Meta e Microsoft, promoveram cortes significativos em seus quadros de funcionários. As demissões ocorreram mesmo em um contexto de receitas crescentes e investimentos bilionários em infraestrutura de IA, indicando uma reestruturação profunda nas estratégias corporativas, com foco em eficiência de custos e automação de processos.
Desemprego cresce e vagas encolhem
Dados recentes reforçam o cenário de desaceleração. A taxa de desemprego em ocupações ligadas à tecnologia vem subindo de forma contínua desde maio e alcançou 4% em novembro, segundo análise da CompTIA, entidade que atua com treinamento e certificações em tecnologia da informação. No mesmo período, o número de profissionais de tecnologia empregados em diferentes setores caiu 134 mil, enquanto o total de trabalhadores na própria indústria de tecnologia recuou em mais de 6.800.
O levantamento também aponta uma retração expressiva nas oportunidades disponíveis. Entre outubro e novembro, as vagas abertas na área diminuíram em mais de 31.800, de acordo com dados do Bureau of Labor Statistics e da empresa de inteligência de mercado Lightcast, citados no relatório da CompTIA.
“Os dados são bastante conclusivos de que o setor de tecnologia está enfrentando dificuldades”, disse Mark Zandi, economista-chefe da Moody’s. “Há uma recessão de empregos no setor, e parece que isso vai continuar, dada a queda nas vagas anunciadas.”
Zandi lembra que, por muito tempo, a tecnologia funcionou como motor de geração de empregos e salários elevados. “Esse impulso agora se transformou em um obstáculo, e parece que esse obstáculo pode se tornar ainda maior no futuro”, afirmou.
O ambiente macroeconômico contribui para o quadro. O Federal Reserve reduziu as taxas de juros pela terceira vez no ano, citando sinais de enfraquecimento do mercado de trabalho. Em novembro, a taxa de desemprego geral dos EUA chegou a 4,6%, o nível mais alto desde 2021. Embora o índice do setor de tecnologia ainda esteja abaixo da média nacional, a diferença vem diminuindo rapidamente.
Consultoria e serviços entre os mais afetados
Algumas funções específicas já sentem o impacto de forma mais intensa. Segundo a CompTIA, vagas ligadas à consultoria de software, segurança cibernética e desenvolvimento web estão entre as mais cortadas. Para Tim Herbert, diretor de pesquisa da entidade, o movimento reflete a redução dos gastos corporativos com projetos de tecnologia, além da retração em contratos governamentais e na oferta de serviços para o exterior.
Herbert observa que a desaceleração na contratação de consultorias tecnológicas pode servir como termômetro para outros setores da economia. “Em alguns casos, pode ser um indicador do desempenho de outros tipos de empresas quando elas param de contratar serviços de consultoria em tecnologia”, disse.
A cautela domina as decisões de contratação. De acordo com Herbert, muitas empresas adotaram uma postura de espera, diante das incertezas econômicas e das dúvidas sobre o impacto de longo prazo da IA. Esse comportamento tende a atrasar a reposição de vagas, segundo pesquisas da CompTIA com diretores de tecnologia da informação.
O pessimismo também aparece na avaliação de acadêmicos. “Estou me sentindo substancialmente mais pessimista”, disse Justin Wolfers, professor de políticas públicas e economia da Universidade de Michigan. Ele citou declarações recentes do presidente do Federal Reserve, Jerome H. Powell, que indicaram possível superestimação nos números de empregos federais. “Isso é bastante sombrio.”
Até agora, as empresas de tecnologia anunciaram mais de 141 mil demissões no ano, um aumento de 17% em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo a consultoria Challenger, Gray & Christmas. Em paralelo, gigantes do setor divulgaram planos de investir até US$ 375 bilhões em infraestrutura de inteligência artificial.
Apesar da retração geral, ainda há áreas com demanda. Mesmo com a queda nas vagas em novembro, empresas seguem contratando profissionais de engenharia e suporte técnico. A IA, no entanto, tornou-se um requisito central. Segundo a CompTIA, 41% das vagas ativas estão diretamente ligadas a funções de inteligência artificial ou exigem esse tipo de habilidade.
“Se você tem habilidades em IA, parece haver empregos”, disse Zandi. “Mas se você não tem, acho que vai parecer que você foi atropelado por um caminhão de lixo.”
Especialistas alertam que será necessário acompanhar os próximos meses para avaliar a real dimensão do ajuste. Wolfers destaca que o impacto da IA deve variar conforme o setor e a ocupação, atingindo programadores e tradutores antes de outras profissões, em um processo que tende a ser desigual e gradual.
Fonte: Portal Terra
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